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ESCAPADELA POR TERRAS DE BASTO
Por António Loureiro (Professor), em 2015/05/04561 leram | 0 comentários | 152 gostam
O Mosteiro de S. Miguel de Refojos, monumento cabeceirense candidato a património cultural da humanidade e o concelho de Cabeceiras de Basto, foram os alvos fundamentais de mais uma escapadela por parte da nossa gente, nesta pausa pascal.
As terras de Basto, do lendário guerreiro lusitano Hermigío Romarigues que em tempos terá sustido as arremetidas das hordas mouriscas comandadas por Tarik e que se encontra imortalizado em Cabeceiras numa estátua em granito implantada na via pública, conhecida como o Basto e símbolo da “raça” das gentes da região, constituíram de facto, conjuntamente com a visita ao mosteiro barroco e beneditino de S. Miguel de Refojos os objetivos principais desta viagem por estas terras de transição, na fronteira raiana entre a alegria minhota e hospitalidade transmontana, agora ligadas entre si por autoestrada, sem o martírio das curvas e contracurvas de antanho.
Ora, o mosteiro fundado ainda antes da nacionalidade e que teve honras de carta de couto concedida por D. Afonso Henriques , em 1131, surpreendeu de facto pela positiva, não obstante a degradação de alguns espaços agora em fase de recuperação e restauro. Todavia, só em 1755 o edifício monástico iniciou sob a alçada do arquiteto André Soares e Frei José Vilaça as obras que lhe deram o atual aspeto, em cuja fachada se distinguem as estátuas em tamanho natural quer do fundador São Bento de Núrcia quer de sua irmã gémea Santa Escolástica. Já no seu interior, sobressai um zimbório em circunferência, pouco frequente em mosteiros beneditinos, que rodeado por uma varanda exibe esbeltas estátuas dos 12 apóstolos em tamanho natural e um outra do arcanjo São Miguel, como remate, estrutura arquitetónica que ilumina profusamente a nave. Destaca-se ainda o altar-mor com credencia, de esplendorosa talha dourada, do qual se relevam belos efeitos especiais como a orla de “chamas”, o pináculo da obra e o fustão de margaridas e rosas no remate da portada. O mosteiro impressiona ainda pelo órgão duplo nas duas laterais (um deles falso ou mudo), belamente decorados alegoricamente na parte superior com estátuas, como as das três virtudes (fé, esperança e caridade) e na parte inferior com horrendas carrancas e figuras diabólicas.
Comporta ainda o mosteiro, nos espaços da antiga sacristia e antessacristia, um interessante Núcleo Museológico de Arte Sacra constituído por um rico espólio de peças de arte religiosa, pinturas e esculturas setecentistas, bem como mobiliário antigo entre o qual se salientam dois belos arcazes, dois contadores e um altar da renascença.
Um agradável surpresa foi também a visita à Casa do Tempo, edifício vizinho do mosteiro, nas margens da ribeira de Penoutas. Neste espaço, conciliando as novas tecnologias de informação e comunicação do presente, com intuitos pedagógicos, lúdicos e informativos, com outros compartimentos mais orientados para o passado, como a cozinha tradicional inserida no denominado “Lugar da Gente”, onde também se incluem artefactos e utensílios agrícolas tradicionais, o edifício desponta como centro interpretativo do concelho, quer no seu território e património quer na sua fauna e flora. Assim, não faltam sequer as imagens laser da serra da Cabreira e os seus sons mais recônditos, em especial o rumorejar dos seus rios e arroios e os uivos dos lobos, mas também os ditos, anexins e quadras de um saber e sabor popular, empírico e ancestral:
 
“ Fui ao céu por um novelo
e desci por uma linha
Fui perguntar ao Senhor
que sorte seria a minha

Salgueiro pega de estaca
Amieiro de raiz
Não digas que não me queres
Que fui eu que não te quis

 Além disso, a casa é também um repositório da história (local) e memória das terras de Basto. De facto, e em especial no “Lugar da História”, lá estão uma réplica da estátua do Basto erigida ao ar livre, do Cálice de Gueda Mendes (agora em Coimbra na Museu Machado de Castro) e do Foral Manuelino de 1514, bem como fotos do Mosteiro de S. Miguel de Refojos e outros objetos de outrora como concertinas valiosíssimas e outros instrumentos musicais ilustrativos dos cantares ao desafio, folclore e da banda musical, memoriais de um pretérito mais ou menos recente, onde não faltam sequer os manuais escolares dos tempos idos, coisas e loisas que se conjugam e complementam com o material multimédia que remete e alude ao ciclo do pão, às chegas de bois e outras tradições regionais.

Após o repasto em Arco de Baúlhe, no restaurante “O Caneiro”, bem servido e saboroso, regado a verde-branco da casta alvarinho/trajadura, pelos mais minhotos e sedentos e a maduro pelos mais transmontanos e durienses (não fosse a zona de transição!), comparticipado com natural partilha pagante pelos abstémios, a viatura rumou ao Núcleo Ferroviário do Museu das Terras de Basto, nesta mesma localidade e freguesia cabeceirense, que em tempos, concretamente entre 1949 e a data do seu encerramento, em 1990, foi estação terminal da Linha do Tâmega. Aqui, além do edifício da antiga estação, bem conservado, assim como os seus jardins adjacentes, mantém-se ainda o cais de cargas e descargas de mercadorias com o respetivo armazém de despachos (atualmente ocupado com uma exposição de latoaria), duas cocheiras, os depósitos de carvão e água e ainda a plataforma giratória usada para inversão de marcha das locomotivas. Mas, de facto, são as locomotivas, automotoras, vagões e furgões de mercadorias e vagão-cisterna o cerne e ponto forte deste museu, em especial as duas sumptuosas carruagens usadas pela rainha D. Amélia de Orleães e pelo rei D. Carlos em Junho de 1907, aquando das suas visitas às termas de Pedras Salgadas.

Em síntese, mais uma visita interessante e bem-disposta rumo a um desconhecido injustamente ignorado, cheio de encanto e ainda por cima aqui tão perto …
 
Escrito por
Álvaro Nunes ( Professor aposentado)


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