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SANTOS DA CASA
Por António Lourenço (Professor), em 2018/02/27374 leram | 0 comentários | 96 gostam
Neste 2018 – Ano Europeu do Património Cultural, o tema escolhido são os santos e as pessoas santas de Urgezes.
1. Izildinha, a santa de Urgezes

Izildinha, a santa de Urgezes, nasceu na Póvoa de Lanhoso, em 17 de junho de 1897.
Maria Izilda de Castro Ribeiro viveu a sua infância humilde com os pais e avós, entre cães, gatos, grilos e outros animais, revelando-se sempre uma menina calma e afetuosa. Porém, devido à profissão de seu pai, mudaria de casa amiudadas vezes. Deste modo, viveria em Fafe, onde permaneceu durante cerca de três anos e frequentou o ensino primário, vindo depois para Guimarães. Aqui residiria no Cano entre 1908 e 1910 e depois no Largo da Estação.
Frequentou então aulas de piano pagas pelo seu padrinho João Duarte Macedo, abade de Donim e prosseguiu os estudos em Braga, até os problemas de saúde a apoquentarem. Efetivamente, na adolescência, surgiram-lhe uns caroços no pescoço, que na época indiciavam o chamado linfatismo, sintomas prováveis de linfoma ou leucemia.
Izildinha faleceria pouco depois, a 24 de maio de 1911, a escassas semanas de completar 14 anos, sendo sepultada no cemitério de Urgezes.
Porém, em 1950, quando tudo parecia esquecido, um dos irmãos, emigrado no Brasil, pediu a transladação do corpo de Izildinha para o túmulo da família. Descobriu-se então, durante a exumação, que o corpo de Izildinha estava intacto e incorruptível, bem como as suas vestes e as flores da sua urna.
Depressa e célere a notícia correu pela cidade, que acolheu o “milagre” como um sinal e prova da santidade deste “Anjo do Senhor” – assim ficaria conhecida.
Izildinha acabaria por ser transladada para o Brasil, após mediação de António Lage Jordão, com uma multidão de fiéis a acompanhar o féretro entre Urgezes e o porto de Leixões.
No Brasil, milhares de pessoas aguardaram a chegada do corpo de Izildinha no navio Bolívia, fundeado no porto de Santos, em trânsito para S. Paulo e posteriormente para Monte Alto.
Izildinha torna-se então num caso de fé popular, embora não reconhecido pela Igreja Católica, venerada como advogada das criancinhas.
Atualmente, a ex-campa de Izildinha estará ocupada pelo homem que ajudou a sua família na sua transladação e recordada numa lápide, datada de 1950.

2. Santo Estevão de Urgezes

Urgezes, cujo orago é Santo Estevão, celebrado a 26 de dezembro, é a referência da freguesia.
Estevão foi um dos protomártires do cristianismo que morreu pela sua fé e um dos sete diáconos da igreja a pregar entre os judeus e gentios os ensinamentos cristãos, logo após a morte de Cristo. Radical e determinado na sua fé, acabaria por isso por ser detido pelas autoridades judaicas e condenado no Sinédrio por blasfémia, com a sentença de morte por apedrejamento. É esta cena do seu martírio por delapidação que se encontra representada no painel de azulejos da atual Igreja Paroquial de Urgezes.
Curiosamente, a sua veneração encontra-se também associada às festas dos rapazes, em Trás-os-Montes, festividades integradas no solstício de inverno, que nos tempos pagãos terão sido dedicadas ao culto do sol, num ritual em que intervêm caretos e máscaras tradicionais.


3. S. Gualter
S. Gualter é o nome do frade franciscano que em 1216/1217 foi enviado para Portugal por S. Francisco de Assis, tendo-se instalado no Monte de Santa Catarina, situado em Urgezes, na atual Fonte Santa, local que foi restaurado em 1995.
Mais um santo venerado pela tradição popular vimaranense pelos seus prodigiosos milagres, que em 1527 constituiriam a Irmandade de S. Gualter em sua honra. No entanto, um santo não canonizado, não obstante o seu culto estar autorizado pela Igreja Católica através de bula papal de Gregório XIII, datada de 1577.
Um santo intrinsecamente ligado aos símbolos da freguesia e, sobretudo, às Festas Gualterianas, cujas raízes remontam às feiras francas de 1542, no reinado de D, Afonso V.
Recentemente, em 2009, as suas relíquias foram (re)encontradas, aquando de umas obras de restauro na Igreja de S. Francisco.


4. S. Tiago
S. Tiago e a extinta romaria em sua honra, realizada a 25 de julho, foi em tempos uma importante festa de cunho fidalgo e de convergência entre as freguesias da Costa, Urgezes e Atães. Com efeito, nesta romaria as três comunidades saíam à rua em procissão, cada uma com o seu andor, convergindo no Largo do Cruzeiro, na Costa, cerca do meio-dia, seguindo depois para a Igreja de Santa Marinha.
Era uma romaria associada ao ciclo agrícola, em especial ao milho e ao vinho, arreigada ao culto pelo santo e à sabedoria popular enraizada no adágio “pelo São Tiago pinta o bago”, na qual era habitual a oferta de produtos da terra, como cravos e alfádegas. Uma romaria e arraial de conciliação entre o religioso e o profano, que geralmente era motivo de rivalidades entre os participantes, cujas armações gigantescas dos seus andores processionais atingiam por vezes 10 a 12 metros de altura e grande ostentação.
Alfredo Guimarães assim descreve um andor de Urgezes: “ e é, por fim assombro das gentes, dado o luxo que ostenta na sua dimensão de dez metros, o andor basilical de Nossa Senhora do Rosário, de S. Estevão, barroco de composição, folheado de seis asas a cada uma das laterais, e cuja reverberação ao sol, premindo toda a cromia exuberante, produz o efeito de uma labareda em êxtasis, resplandecendo, rezando, palpitando!”.
Porém, de acordo com relatos da época, o fim determinante desta romaria e a sua extinção (supostamente em 1945) estará ironicamente ligada à rivalidade entre os seus participantes e à sua ostentação; de tal forma que acabaria por obrigar à intervenção reguladora das autoridades eclesiásticas (nem sempre cumprida) e ao seu interregno entre 1935 e 1940.
Perdia-se assim uma das tradições religiosas e populares mais marcantes de Guimarães que “foi uma das mais fidalgas e importantes romarias da nossa terra”, mas que – escreve o Comércio de Guimarães de 16 de julho de 1944: “hoje … é o passado, a esvair-se cada vez mais …”

Santos de casa e vizinhos, que presumidamente fizeram (alguns) milagres …

Texto escrito por
Álvaro Nunes

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