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A FESTA E O SERMÃO DO PELOTE
Por António Lourenço (Professor), em 2018/07/03706 leram | 0 comentários | 106 gostam
A Festa do Pelote comemora-se anualmente em Guimarães em 14 de agosto. A celebração visa recordar a batalha de Aljubarrota, que marcou a independência de Portugal face a Castela, após a crise de 1383-1385.
Com efeito, para além da fundação da nacionalidade e início das conquistas, com D. Afonso Henriques, a cidade de Guimarães está também intimamente ligada às lutas de independência e ao Mestre de Avis. De facto, D. João I tinha uma profunda devoção pela Senhora de Guimarães e aqui terá estado várias vezes como romeiro, uma delas antes da batalha de Aljubarrota, em 1385, na qual se terá encomendado à Senhora da Oliveira e pedido proteção. Deste modo, após a batalha, o rei veio a Guimarães agradecer a vitória e depor as suas armas no altar da Senhora da Oliveira, afirmando:
“Vós, Senhora, mas deste, vós as tomai e guardai”.
Assim, entre outras oferendas, o rei deixou na Colegiada a lança e o pelote (peça de vestuário de linho acolchoado com lã, que se usava como proteção, por baixo da armadura). Ora, é este pelote (loudel ou laudel), ainda hoje conservado no Museu Alberto Sampaio, que tradicionalmente era colocado num dos arcos do Padrão da Senhora da Vitória, situado junto à Igreja da Oliveira (padrão construído no reinado de D. Afonso IV, que recordaria a vitória dos cristãos na batalha do Salado).
Porém e embora esta tradição da Festa do Pelote relembre sobretudo a recuperação da independência no século XIV, a comemoração está também intrinsecamente envolvida na restauração da independência, em 1640, no decurso do domínio espanhol e filipino. Com efeito, em 1638, cerca de dois anos antes deste marcante episódio histórico da restauração da independência, o franciscano Frei Luís da Natividade, guardião do Convento de S. Francisco, em Guimarães, seria o orador do célebre Sermão do Pelote, que era costume proferir em 14 de agosto e a voz profética da libertação.
E assim diria corajosamente aos presentes, perante as autoridades espanholas, apontando solenemente em direção ao pelote roto, pobre, esfarrapado e alanceado:

“Para bem saberdes quão perdido temos o reino, olhai para este retrato dele e vê-lo-eis bem pintado (…) O Reino que nessa roupa do invicto Senhor D. João nosso rei dedicou e sujeitou à Virgem da Oliveira, quando o vedes em tal estado, nele vedes também qual esteja o Reino.
Vejo-vos, pelote, velho e roto: vejo-vos atravessado com a vossa própria lança (…) Só me resta para consolação ver-vos diante da Virgem da Oliveira, que se uma vez vos livrou da morte, vos pode ainda ressuscitar a nova vida”

O pelote era assim usado, em linguagem metafórica e revolucionária, como um símbolo de um país roto e velho que carecia de fazer ressurgir e levantar novamente os seus valores da liberdade de outrora. Um país que necessitava de rejuvenescer, como acontecera em 1342 aquando do milagre da oliveira, que apesar de ressequida voltaria a ficar viçosa. Por isso, acrescentaria:

“Ainda pode haver vida para vós, ainda pode haver século florente, e tornardes neste a reverdecer, como essa (oliveira) reverdeceu ficando duzentos e cinquenta anos a esta parte sempre verde (…)
Mas se quereis que viva, floresça, seja sempre verde, conservai-lhe a esta oliveira as suas folhas, sua autoridade, seus foros, suas liberdades, seus privilégios (…).

Frei Luís da Natividade não podia ser mais direto neste sermão do pelote, autêntico símbolo e pretexto de pregação visionária da libertação e restauração da independência, que não tardaria.
Camilo Castelo Branco consideraria (mesmo) que este “Retrato de Portugal Castelhano” – assim intitulado - era “o melhor sermão em português que conhecia” .

Mas sobre o rei D. João I e Guimarães, recomenda-se ainda uma visita ao Museu Alberto Sampaio (MAS), local onde também poderás encontrar o famoso “Tríptico da Natividade”, recuperado na batalha de Aljubarrota.
 Ademais, a participação em atividades promovidas pelos Serviços Educativos do MAS pode ser outra mais-valia que se recomenda. São exemplos, a sessão de teatro de marionetas intitulada “Como D. João I tomou a vila de Guimarães!”, ou o teatro de sombras sobre a lenda da oliveira ou a lenda do espirro de D. João I, entre outras, como os roteiros temáticos. A representação destas peças na tua escola e/ou encenação do sermão do pelote, poderá também ser uma interessante hipótese de trabalho.
Igualmente, como sugestão complementar, a leitura do livro “D. João I e Guimarães” de Rosa Maria Saavedra, direcionado para o 1º. e 2º, ciclos, que conta com ilustrações de Vasco Carneiro .
Finalmente, a subida da Rua D. João I entre o Padrão de D. João I, em frente à capela de S. Lázaro (junto ao shopping) e o Padrão de Nossa Senhora da Vitória, situado junto ao adro da Nossa Senhora da Oliveira. Deste modo, evocarás uma das piedosas romagens que, segundo a tradição, o rei terá levado a cabo e terás (ainda) oportunidade de apreciar estes dois monumentos nacionais nas suas dimensões histórica e estética.

Texto escrito por
Álvaro Nunes

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