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FIGURAS NICOLINAS (I)
Por António Loureiro (Professor), em 2016/10/28555 leram | 0 comentários | 159 gostam
S. Nicolau, patrono das festas, a senhora Aninhas, mãe dos estudantes e Hélder Rocha, Nicolino-Mor, são três das proeminentes figuras nicolinas que vamos destacar separadamente nestas páginas.
S. NICOLAU
S. Nicolau, patrono das festas nicolinas, terá nascido em Pátara, na Lícia, por volta do ano 270, tendo herdado avultados bens dos seus pais, falecidos devido a uma epidemia , quando era ainda muito novo.
Nicolau dedicou toda a sua vida ao serviço religioso e a ações altruístas, tendo sido monge e abade e posteriormente arcebispo de Mira. Como muitos sofreu a calamidade das perseguições e até a prisão do império romano. Regressaria porém à sua diocese, no governo de Constantino Magno, tendo sido um dos 318 bispos que condenaram o arianismo no primeiro concílio de Efeso.

Sua vida foi também e fundamentalmente dedicada aos outros, em especial como protetor dos jovens, tendo usado a sua riqueza no exercício de obras de caridade, especialmente de raparigas condenadas aos prostíbulos.
Bastante venerado e popularizado após a sua morte, no ano 325, foram as suas relíquias transferidas para Bari por devotos mercadores, em 1087, uma vez que Mira caíra em poder dos turcos. Assim, em Bari ser-lhe-ia edificada uma magnífica igreja em sua honra, passando o seu culto a expandir-se por todo o ocidente, que em diferentes zonas da Europa assumiria formas e folguedos diferenciados, em especial a 6 de dezembro, dia da sua festa litúrgica, segundo o Flocus Santorum.

Deste modo, S. Nicolau é celebrado pelas crianças da Alsácia, que na noite de 5 para 6 de dezembro colocam um sapatinho na chaminé, para receberem presentes do santo, mas é também orago de uma das igrejas do centro da cidade do Porto. Nesta cidade é costumeiro a 6 de dezembro a oferta pelo abade da freguesia de uma rasa de castanhas para um magusto popular, cuja lenha é pedida pelos garotos ao som de campainhas apregoando “Quem dá um pau por S. Nicolau!”..
 
Seu culto está ainda referenciado em Slobregât, Panades, em Espanha, na ex-URSS, na Bélgica e ainda em Bari, na Itália. Outrossim, a tradição da sua veneração está igualmente popularizada no norte da Europa com o famoso Pai Natal, o homem do saco das prendas que a publicidade e uma campanha de marketing da Coca-cola vestiram de vermelho, conduzindo um trenó puxado por renas.
Todavia, para além da sua manutenção sob a figura de Santa Claus (Sanctus Nicolaus), S. Nicolau é também considerado protetor dos famintos (por ter feito multiplicar o pão em tempo de fome), bem como das raparigas pobres (pelo dote que lhes fazia chegar em segredo pelas janelas, permitindo desse modo que pudessem casar) e ainda patrono dos perseguidos (por ele mesmo ter sido perseguido pelo imperador romano Diocleciano). São-lhe também atribuídas a proteção aos comerciantes (pela transferência das suas relíquias para Bari, graças a comerciantes) , assim como aos marinheiros e navegantes (pela viagem de suas relíquias por mar, até Bari). É também venerado como padroeiro das crianças (pela sua devoção para com Santa Claus) e ainda patrono dos presos, infelizes e abandonados da sorte (pelos milagres que lhe são atribuídos).

Entre os seus principais milagres e atos de benfeitoria destacam-se o salvamento de três meninos, que depois de esquartejados por um estalajadeiro foram ressuscitados pelo santo, bem como a atribuição de dotes às raparigas pobres, que recebiam pela chaminé ou pelas janelas prendas e valores, de forma a angariarem bens materiais que garantissem o seu casamento e evitassem a sua venda para os prostíbulos.

Em Guimarães o santo é venerado de forma singular e única nas Festas Nicolinas, remontando a 1691 a fundação da Irmandade de S. Nicolau, com o objetivo de “promover o culto e veneração ao seu padroeiro, S. Nicolau, bispo de Mira”, que estatutariamente passaria por “sufragar as almas dos irmãos falecidos”, bem como “cumprir encargos e legados pios” e “promover o espírito de solidariedade entre irmãos”.

Contudo, as festas e o culto de S. Nicolau terão reminiscências mais vetustas e anteriores a 1691. Com efeito, data de 1190 a renomeação de Paio Galvão como mestre da Escola da Colegiada, cujos estudantes de Humanidades, com a sua devoção à Virgem, teriam estado na origem remota das Festas Nicolinas. Por outro lado, é de crer que a tradição escolástica vimaranense não se tenha apenas confinado à Colegiada e haja também assentado sustentáculos na Universidade da Costa, no século XVI. Aliás, já no Inventário Geral da Colegiada de 1564 pode ler-se que “a Capela de S. Nicolau fizeram-na os estudantes desta vila e outros devotos de dinheiro que ganharam em comédias e danças”, o que comprova que o culto ao santo é anterior à fundação da sua Irmandade.
Curiosamente foram também as verbas resultantes das Danças e da Câmara Municipal que permitiram obter fundos financeiros para a reconstrução da capela do santo, uma vez que na segunda metade do século XX, por força do restauro da Igreja da Oliveira, aquela fora desmontada e suas pedras amontoada na Colegiada até à sua reedificação na segunda metade dos anos 90

Hoje a capela do santo localiza-se ao lado e anexa à Igreja da Oliveira, local onde ocorre anualmente, a cargo da Irmandade de S. Nicolau um cortejo em sua honra , no dia 6 de dezembro, ou domingo mais próximo desta data, que habitualmente percorre o curto caminho entre a capela e a Igreja da Oliveira, regressando à sua orada após a realização de uma missa solene.
 
Porém, a despeito das tentativas e campanhas eclesiásticas para dar a estas festas um cunho de cariz mais religioso, estas foram oportunamente apropriadas pelos estudantes vimaranenses, que as transformaram numa festa popular e profana, sendo hoje uma realidade cultural exclusiva e original, que obviamente tendo evoluído com os tempos, mantém a sua força mobilizadora da alma estudantil e vimaranense.
Aliás o próprio termo nicolinas será um neologismo recente, que apenas terá surgido no Pregão de 1904, escrito sob a pena de João de Meira, evidenciando deste modo que as festas tiveram um percurso de séculos e de adaptação aos tempos …


Texto escrito por

Álvaro Nunes


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