VIMARANENSES ILUSTRES | |
Por António Lourenço (Professor), em 2015/09/08 | 816 leram | 0 comentários | 194 gostam |
Passaram no pretérito dia 30 de agosto 150 anos do nascimento do Padre Gaspar Roriz, uma das ilustres figuras da vida vimaranense nas primeiras décadas do século XX. | |
O Padre Gaspar da Costa Roriz nasceu em 1865 na Rua D. João I, filho do mestre barbeiro José Pedro da Costa Roriz e de Teresa Maria de Jesus de Sousa. Considerado um dos grandes animadores das Festas Nicolinas, escreveu pregões, redigiu e ensaiou textos das Danças e dedicou às festas estudantis o “Auto da Saudade”, que seria “levado à scena no Theatro D. Afonso Henriques, em 1920”. De igual modo, escreveria ainda uma peça de teatro intitulada “Os dois marçanos” (1910), uma comédia/drama em três atos, que seria representada pelo Sindicato Nacional dos Caixeiros de Guimarães, bem como a denominada “Oração fúnebre” (1916) e ainda poesia, com a obra “Um sonho Oriental” (1908). Transcrevemos, a título ilustrativo, excertos de um dos seus Pregões Nicolinos, datado de 1906, época em que discutia quais as festividades que deveriam justamente ser consideradas as festas da cidade (Nicolinas dos estudantes ou Gualterianas dos caixeiros): “A Festa da Cidade é, pois, a nossa festa De todas a mais bela, antiga e popular Há nela vibrações de zambumbal orquestra E o eléctrico fulgor dos raios do luar … Ó patriotas bons, ó bons Gualterianos, Em todo o caso vós mereceis os parabéns! Com vossa iniciativa, esforços sobre-humanos, Pudeste levantar a velha Guimarães. (…) Caixeiros atendei: não há rivalidade Que possa separar os nossos corações. Caixeiros, como a nossa é a vossa mocidade: Deixai-nos também ir dar vivas aos patrões … (…) Na festa a Nicolau, amigos, não entrais: Mas um abraço bom de confraternidade Lutemos em comum por nobres ideais. Há um cuja diferença, amigos, não distingo; Os nossos corações sentem de igual maneira: Por que é que vós lutais? Descanso ao domingo; Que reclamamos nós? – Feriado à quinta-feira …” Porém, mais do que tudo, a sua Guimarães e as Nicolinas estavam sempre no centro do mundo, como a própria deusa Minerva o reconhece: “A Diva percorreu as grandes capitais: Viu Roma, viu Veneza e Lisboa com seu Tejo; Viu Ronfe, o Pevidém, a Pisca e os Pombais … Ao ver Guimarães disse: Eis a terra que almejo! Palácio encantado, em sonhos de ventura Eu vi teu céu de anil alfombras verdejantes! Tu és a terra amada, a terra linda e pura Onde mais brilho têm as festas de estudantes”. Festas que têm no seu cerne a mulher e a sua beleza ímpar: “Senhoras, perdoai estas divagações … A festa é para vós, filhas de Guimarães! De amor palpitam hoje os nossos corações, Assim aconteceu a vossas santas mães. De Nicolau no dia, alegres, delirantes, Quando seguia Apolo a estrada da manhã, As vossas santas mães das mãos dos estudantes Vinham arrecadar a posse da maçã. (…) Não há nação que exceda, ó Pátria Portuguesa, A formosura ideal das filhas que tu tens! Ó loiras de Albion! Caucásia beleza! Vencidas sereis sempre aqui, em Guimarães”. Guimarães, cidade de progresso e tradição, nomeadamente pelo seu património material e imaterial, são as suas divisas, novamente cantadas no pregão de 1925: “ Ó minha Guimarães, ó minha terra amada! Adora-te a minha alma em êxtase, ajoelhado Ao recordar que foste, em tempos que lá vão, O berço de Portugal, o berço da Nação”. (…) Conserva as tradições, ó Pátria eu te peço; Oh! Ergue as chaminés das fábricas - é o progresso (…) Mas, Pátria, por favor, Não desprezes jamais a tradição galante desta festa sem par – a Festa do Estudante, a Festa a Nicolau!”. Por isso incita revolucionariamente as gerações futuras a manter viva a voz Nicolina: Rapazes, atenção! As peles desses bombos Tiradas são talvez dos pestilentos lombos de alguma cabra velha ou raposa manhosa. Matai, matai a cabra, arrasai a raposa. Arrancai-lhes do bucho estrondos de morteiro Como em 5 de Outubro e 13 de Fevereiro! Que se oiça em toda a parte um eco profundo Que faça estremecer a terra, o mar e o mundo”. Reconhecido também pelos seus dotes oratórios, o Padre Gaspar Roriz brilharia ainda pelos seus sermões e no jornalismo da época, tendo sido redator principal do “Eco de Guimarães”, a partir de 1899 e posteriormente diretor e proprietário do “Regenerador”, que fundou em 1908. Paralelamente, para além da sua função de sacerdote, foi também professor do Liceu, encenador e exerceu o cargo de comissário da Ordem Terceira de S. Francisco. Do ponto de vista pessoal era considerado um bom conversador e um homem culto, sempre pronto para uma tertúlia e acima de tudo uma pessoa profundamente apaixonada pela sua terra, ou seja, um vimaranense dos quatro costados. Consta até que franqueava alegremente as portas da sua casa a todos que proferissem a senha “Por Guimarães!”. Foi esta dedicação à sua terra natal que o tornaram um dos mentores e inventores da Marcha Gualteriana, que pela primeira vez saiu à rua em 1907 e o levaram no ano precedente a compor a letra do Hino da Cidade de Guimarães, com música de Aníbal Vasco Leão: Oh! Guimarães, teu progresso, tua vida É toda a nossa aspiração; Terra bendita, oh! Pátria querida, Tens um altar dos filhos teus no coração. Oh! Guimarães, teu progresso, tua vida. A ti ó Pátria! A ti ó Pátria! O nosso amor, nossa vida e mocidade Consagramos Com fervor! Salvé! Salvé! Oh! Ínclita Cidade! (…) O padre-artista Gaspar Roriz, assim ficou conhecido, faleceria em 7 de março de 1932, certamente orgulhoso da sua ação em prol de Guimarães. Quiçá, por isso, a vida providenciou-lhe ainda ensejo a presenciar um momento marcante da sua história: as celebrações do oitavo centenário da Batalha de S. Mamede, em 1928, cerimónia em que lhe coube a honra de discursar publicamente. Posteriormente, a Associação dos Antigos Estudantes do Liceu de Guimarães, recordou o seu nome e prestou-lhe a devida homenagem, em 1965, no centenário do seu nascimento. A cidade recorda-o também na sua toponímia. Esperemos que em 2015 não seja esquecido … Texto escrito por Álvaro Nunes | |
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