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URGEZES E AS NICOLINAS
Por António Loureiro (Professor), em 2014/10/16748 leram | 0 comentários | 193 gostam
Urgezes e o Agrupamento de Escolas Gil Vicente, encontram-se intrinsecamente ligado às Festas Nicolinas. Ora, Urgezes, está de facto e historicamente ligada a estas festas, em especial aos números das Posses e das Maçãzinhas.
De facto e como se pode ler na obra “A Alma e a Graça das Festas Nicolinas” de Lino Moreira da Silva (texto) e Américo Sá (pinturas), segundo a tradição “ um Cónego da Colegiada deixou em testamento, a dada altura (terá sido no século XVII), uma Renda em Urgezes, que se instituiu em Posse. Desse legado usufruíram, a par dos Coreiros, também os Estudantes, que juntamente com eles frequentavam as aulas de Latim na escola da Colegiada (…). Essa Posse “era constituída por castanhas e vinho, maçãs, tremoços e nozes, palha e lenha” e, ao que consta, remontará pelo menos a 1717.
Ora, seria este número Nicolino das Posses, atualmente realizado a 4 de dezembro, cuja origem estaria em Urgezes, que constituiria “ a mais antiga Posse Nicolina (…). Esta Posse passou a ser, a partir de determinada altura, muito regateada, sendo o Rendeiro por várias vezes acusado (e até ameaçado) pelos Estudantes de não a querer cumprir. Aliás, esta renitência no cumprimento da Posse acabou por dar origem a uma questão em tribunal, entre Estudantes e Cónegos da Colegiada”. Porém, “estes últimos aproveitaram a extinção oficial das Rendas, em 1832, para acabar com a Posse de Urgezes”, pelo que “os Cónegos da Colegiada deixaram, então, e definitivamente, de ser obrigados a contribuir para as Festas dos Estudantes com aquela velha Posse”.
Contudo “depois que esse legado terminou, a mesma Posse passou a ser simulada pelos Estudantes, ainda em Urgezes, durante algum tempo” e muitas e outras variadas posses surgiriam. Recorde-se, por exemplo, a emblemática Posse do Barroca, em que o dito cujo mostrava o rabo aos estudantes, porque dizia: “não tenho nada para vos dar”. Relembre-se e leia-se ainda, a este propósito, o belo texto de Raúl Brandão intitulado “Cucúsio”, inserido na obra “A Farsa”, que relata uma posse de 1903, em que também esta figura ou personagem mostra o dito cujo …
Nos nossos dias e após um longo interregno, a posse de Urgezes (também denominada Dízimo ou Renda de Urgezes) regressou, graças a uma proposta da Junta de Freguesia, presidida pelo socialista Manuel Nunes, que a Assembleia de Freguesia de Urgezes, deliberou restaurar. Deste modo e anualmente esta posse continua efectivar-se, a 4 de dezembro, geralmente acompanhada pela representação de um diálogo satírico, entre estudantes e a autarquia, intitulado “Auto do Dízimo de Urgezes”, por vezes dramatizado a nível escolar. Marcante, neste último caso, recorde-se o auto representado pelo Clube de Teatro, em 2010, que conciliou o centenário da implantação da República e os 150 anos do nascimento da Senhora Aninhas, mãe dos estudantes vimaranenses.
Mas, para além do número das Posses, a freguesia de Urgezes está também indirectamente ligada às Maçãzinhas, cortejo de carros alegóricos e número de cariz romântico, que têm como cerne a mulher e o amor.
De novo citamos a referida obra: “as Maçãzinhas, se surgiram nos primeiros tempos da Festa dos Estudantes de uma dádiva informal, aproveitando a recolha do legado de Urgezes, depressa ganharam outra consistência e se foram reforçando em características e significado, recebendo influências desse movimento cultura” (leia-se movimento romântico).
Por isso, também anualmente e mercê de um protocolo subscrito entre a Direção Executiva do Agrupamento de Escolas Gil Vicente e a Associação dos Antigos Estudantes do Liceu de Guimarães/Velhos Nicolinos, os estudantes deste estabelecimento de ensino concebem e executam um carro alegórico que desfila na cidade no cortejo das Maçãzinhas, mantendo viva a tradição e o envolvimento da comunidade, levando a cabo um projeto pedagógico motivador, que ao longo destes últimos anos tem suscitado atividades tão diversas com a investigação histórica local (através da pesquisa e colóquios), a produção jornalística no jornal escolar, as visitas de estudo (artesões nicolinos, locais da tradição Nicolina), concursos variados (quadras satíricas e montra Nicolina), potenciando deste modo o espírito lúdico e criativo, bem como a socialização dos alunos.
Este ano e de novo o Agrupamento de Escolas Gil Vicente estará presente, contribuindo para a prossecução desta centenária tradição estudantil vimaranense (ler em separado o texto Nicolinas). Desta feita e novamente em parceria com a Vaca Negra - Centro para a Criação, Arte e Cultura, o agrupamento irá participar não só com um carro alegórico alusivo aos “800 anos da Língua Portuguesa” como também participando no “Auto do Dízimo de Urgezes”, do qual antecipadamente usurpamos a seguinte passagem:
E como vai o nosso Vitória Com Vitória a treinador Uma equipa de tostões
Cá no nosso campeonato? E um Afonso a central E de vitorianos de raça
A carreira é promissória Regressa o conquistador Mostram valer milhões
À Europa é candidato … Que nos levanta o astral E conquistarão nova Taça

Com efeito, há que dar seguimento a esta festa, em nome das várias gerações de vimaranenses. Efetivamente, datará por volta de 1661/1663, o culto de S. Nicolau, em Guimarães, altura em foi construída a capela do santo, na Igreja da Senhora da Oliveira e nela sediaram a sua Irmandade, cujos estatutos remontam a 1691 e muito especialmente agora, quando se aponta a sua candidatura a património imaterial da humanidade. Crê-se todavia que as raízes destas festas, que começaram por ser religiosas e foram apropriadas pelos estudantes e por estes progressivamente profanadas, terão ainda uma génese mais longínqua e ancestral, tendo chegado até nós através das influências exercidas pelos romeiros de Santiago e possivelmente mercê da mobilidade dos professores e alunos com o estrangeiro, nos tempos da Universidade da Costa (1537-1550). Festas que obviamente tiveram o seu centro fulcral no santuário da Nossa Senhora da Oliveira, espaço especial de romeiros e devotos desde a Idade Média e local privilegiado por benefícios reais, sobretudo D. João I, que concedeu a Guimarães, entre outros os “Privilégios das Tábuas Vermelhas”.
Tradição, história e festa conjugam-se assim secularmente no culto de S. Nicolau, bispo de Mira (Turquia) dos séculos III/IV , protetor das raparigas pobres, dos perseguidos e das crianças, que o calendário da igreja celebra a 6 de dezembro e que certamente, estamos convictos, irá eternizar-se e imortalizar-se “ad perpetuam” …


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