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SANTO AMARO, A PRIMEIRA ROMARIA DO ANO
Por António Lourenço (Professor), em 2014/01/13893 leram | 0 comentários | 172 gostam
Ano após ano, Santo Amaro celebra-se em Guimarães nas freguesias de Arosa e Mascotelos, a 15 de Janeiro, assumindo-se como a primeira romaria do concelho vimaranense.
Porém, em Mascotelos, nossa freguesia vizinha, as celebrações de Santo Amaro adquirem um cunho peculiar. De facto, entre 15 de Janeiro e o domingo mais próximo, o santo é venerado quer religiosamente quer na perspetiva profana, destacando-se neste domínio o famigerado “jogo de brilhantes”, o arraial e especialmente a feira franca de gado bovino.
Efetivamente, para além dos aspetos religiosos, entre os quais se realça o ritual processional, ao fim da manhã de domingo, procissão em que Santo Amaro segue em destaque no séquito, acompanhado pelos andores de S. Vicente e S. Sebastião, que consigo partilham o templo e também se festejam em Janeiro, bem como a missa solene e os pedidos de graças e cumprimento de promessas, nos quais os voventes se fazem acompanhar de cera modelada com a forma votiva das partes do corpo humano com enfermidades (braços, pernas, mãos, pés), a vertente profana é porventura a que mais sobressai nesta tradicional romaria. Com efeito, como escreveu Alberto Vieira Braga, “ir à romaria de Santo Amaro é ir ao encontro dos namorados, dos brilhantes, do movimento, da algazarra, dos bons farnéis e, por vezes, da larga pancadaria, entre os rivais do derriço”.
Talvez os tempos sejam agora outros e coisas houve que mudaram. Todavia, o arraial continua, na boa tradição minhota, com cantares ao desafio, grupos folclóricos, bandas filarmónicas e música popular portuguesa, não faltando por vezes as atuações de fanfarras, as exibições dos Zés Pereiras, os leilões de prendas, as sessões de foguetes ou de fogo de artifício e a venda ambulante dos produtos mais diversos e inesperados, entre os quais se mantêm ainda as tendas das roscas e dos rosquilhos.
A feira anual de gado bovino, por seu turno, é provavelmente um dos principais números de interesse da romaria, no dia do santo (15 de Janeiro). Aí os lavradores reencontram velhos conhecidos e amigos e negoceiam seus animais, cujos preços regulam normalmente, todos os anos, os valores do gado bovino. Contudo, nesta feira, para além do negócio, os camponeses mostram ainda o seu orgulho pelas suas criações de gado, exibindo com aparato suas reses, que geralmente exibem enfeites e asseio: “encarapinham-lhes a pelugem com vinagre e sabão, as hastes são envernizadas com azeite e os cascos com petróleo, enfeitando as cabeças das juntas e dos toiros com flores, quando não pendem das alentadas cachaceiras aquele luxo da coleiras mouriscas, a que chamam correões de campainhas, no tilintar de muitos sons franzinos e no engalho de muitas bolas pendentes” , escreveria o citado Alberto Vieira Braga, a propósito desta feira franca.
Por sua vez, o “jogo dos brilhantes”, que consiste em atirar à cabeça dos romeiros, em especial jovens solteiros, papelinhos pequeninos, coloridos e brilhantes, em ritual de enamoramento, era um hábito tradicional desta festa, que tantas vezes não só levava ao altar mas também frequentemente a brigas por rivalidade ou abusos, em especial quando os brilhantes erm despejados sobre mulher casada os comprometida. Hoje, os e-mails e as SMS substituem estes rituais antigos que praticamente não se cumprem em Mascotelos, embora subsistam em Arosa, a outra freguesia vimaranense veneradora deste santo, lá no extremo do concelho, na fronteira com a Póvoa de Lanhoso e Fafe.
Quanto ao santo, crê-se que terá nascido em Roma, quiçá em 510, e que terá sido entregue aos cuidados de São Bento, com apenas 12 anos. Com o seu mestre terá fundado em 528 a Abadia de Monte Cassino e introduzido na Gália a Ordem de São Bento. Entre os milagres deste monge beneditino consta que terá caminhado sobre as águas, sem se aperceber, para salvar uma criança de morrer afogada. Considerado com um homem de virtudes e cumpridor do ideal monástico é hoje venerado pela crença da sua intercessão para a cura das doenças relacionadas com os ossos. Por isso, nos seus locais de culto os promitentes deixam frequentemente peças de cera em forma de braços ou pernas, mas também muletas, que são ofertadas pelos fiéis curados e que já não precisam delas para caminhar sobre a vida. Daí que, curiosamente, o santo seja iconograficamente apresentado com uma muleta, acompanhada por um báculo abacial, com sua vestimenta de frade, com capuz.
Crê-se ainda que sua veneração remontará à data ancestral de 1604, data da primitiva edificação da sua capela em Mascotelos, que posteriormente em 1770 seria transformada em Igreja Paroquial. Em Arosa, por sua vez, a capela do santo será mais tardia e datará do século XVIII, situando-se a escassos cem metros da Igreja Paroquial.
Deste modo, a romaria de Santo Amaro, além da ser a primeira romaria do ano, fica ainda referenciada, em Mascotelos, como o tempo da feira de gado bovino, que outrora fora quinzenal, mas que ainda hoje se conserva anualmente, no dia do santo, como reguladora do mercado, conforme nos narra Alberto Vieira Braga: “ainda ali se efectua a 15 de Janeiro de cada na ano, sendo a maior do concelho, porque é reguladora dos preços do gado bovino”.
Professor Álvaro Nunes

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