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Nicolinas - Que futuro?
Por António Loureiro (Professor), em 2014/12/18640 leram | 0 comentários | 171 gostam
Ainda sobre o futuro das Festas Nicolinas....!
As Festas Nicolinas são, por afinidade, as festas maiores da cidade de
Guimarães. A sua evolução, fruto de mais de três séculos de tradição,
não deixa margem para dúvidas: as barreiras tendem a esbater. Para
quê, então, alguns assomos ditatoriais que têm vindo a lume?

A recente polémica com o impedimento da participação das EB 2,3 no
tradicional cortejo das Maçãzinhas vem abrir uma ferida profunda, mas
não incurável.

Deixo aqui alguns excertos de uma pena muito mais autorizada do que a
minha: o Professor António Amaro das Neves, antigo Presidente da
Sociedade Martins Sarmento, escrevia assim no seu blog de referência
"Memórias de Araduca", a 4 de Dezembro:



Pelos vistos, o que se está a passar com as Nicolinas, nomeadamente
com a tentativa de expulsar da entrega das maçãs os estudantes mais
novos ameaça assumir contornos sérios. Era bom que as pessoas parassem
um pouco para pensar. Aqui ficam algumas notas para a reflexão que se
impõe, a ver se se põe algum juízo em certas cabeças que, pelos
vistos, julgam que as festas dos estudantes são uma coutada sua.


1. S. Nicolau é o padroeiro das crianças e, por extensão dos
estudantes, que, regra geral, são tenros de idade. Será preciso
explicar o que seja uma criança?


2. As festas dos estudantes de Guimarães começaram por ser celebradas
pelos meninos do coro da Colegiada. Será preciso explicar o que seja
um menino?


3. Por todo o lado S. Nicolau é festejado por meninos muito jovens.
Para não ir mais longe, vá-se aqui ao lado, por exemplo, a Espanha e
veja-se o que é a festa do Obispillo, que tem muitas semelhanças com
as Nicolinas, na sua forma original.


4. Os jovens estudantes de ciclos inferirores ao actual ensino
secundário sempre participaram nas festas, POR DIREITO PRÓPRIO.


5. No século XIX, por exemplo, as festas eram animadas pelos
estudantes da Escola do Venâncio. Veja-se uma descrição, publicada no
Comércio de Guimarães, há precisamente 98 anos:


No dia 6, era depois do magusto, em Santo Estêvão*, a distribuição das
maçãs e castanhas às damas de Guimarães, vindo os estudantes a cavalo,
trazendo lanças enfeitadas com laços de seda, estes os mais pequenos,
e a Comissão e outros estudantes mais taludos, em carros. Esta
distribuição fazia-se pelo meio-dia, e terminava às duas horas da
tarde.

Logo que chegavam ao Toural, a primeira coisa que faziam era dar meia
volta em redor do pinheiro, como homenagem à deusa da Ciência.

Em seguida, dispersavam, indo todos ou quase todos ao Convento de
Santa Clara, hoje seminário, levar as maçãs às freiras, que as
recebiam, fazendo troca com doces que lhes enviavam das suas celas em
cestinhas presas por fitas de cor.

Às duas horas da tarde saíam as danças: uma, a dos pequenos
estudantes, outra, a dos grandes.


*Santo Estevão de Urgezes


6. Acresce que, em pleno século XX, ao longo de três décadas, em
Guimarães não houve ensino liceal secundário, que foi extinto no ano
de 1928, sendo apenas retomado no ano de 1958. Nesses anos, o Liceu de
Guimarães apenas tinha oferta até ao 5.º , correspondente ao actual
9.º ano. E, que me conste, nessas três décadas as festas não se
extinguiram. Antes pelo contrário. Mantiveram-se sempre bem vivas.


7. Todos nós, os que passamos pelo Liceu de Guimarães enquanto em
Guimarães houve liceu e foi liceu (e já não o há desde a introdução do
ensino unificado, há quase quatro décadas), sabemos que nunca os mais
jovens foram impedidos de participar no cortejo da entrega das maçãs,
antes pelo contrário:eram os principais animadores deste número, que é
o principal das nicolinas.


8. Assim tem sido ao longo dos últimos anos: não fosse o entusiasmo
dos estudantes do 3.º ciclo, e as Maçãzinhas seriam hoje um espectro
do seu passado luminoso. Para perceber isto, não é preciso mais do que
olhar para a lista dos carros premiados em anos próximos, onde
normalmente sobressai a Escola Gil Vicente, de Urgezes, que nunca teve
ensino secundário.


9. As festas Nicolinas não têm dono. Não pertencem a um ciclo de
ensino, nem a uma escola, nem, muito menos, a qualquer pessoa que,
sustentada por uma profunda ignorância, imponha a sua influência aos
jovens da Comissão de Festas.


10. A Comissão de Festas não tem mandato para fazer o que der na
veneta aos seus membros, nem para executar aquilo que algum tonto lhe
sopre. Tem como missão organizar as festas e assegurar que a tradição
se cumpra. Não está nas suas mãos, nem no seu estatuto, retirar o
direito de participação a quem sempre o teve. Se fizer o que dela se
espera, já haverá motivos de sobra para merecer o nosso
reconhecimento. Mas que não se atrevam a mexer no que está quieto.

A 9 de Dezembro voltava à carga:



A história das festas dos estudantes de Guimarães está repleta de
crises, querelas e disputas que são tão antigas como elas e que, se
não primaram sempre pela elevação, foram, regra geral, virtuosas, por
induzirem rupturas que possibilitaram importantes saltos em frente.
Percebe-se que nos tempos que correm se vive um desses momentos que,
como manda a tradição da terra, não se deve deixar entaramelar com
papas na língua, nem amaneirar com paninhos quentes. Aqui irei
deixando contributos para o debate que se impõe, que começa com a
enumeração de alguns problemas que sinto e que pressinto, a saber:


1. De quem são as festas nicolinas? Dos estudantes de uma escola? Dos
estudantes que frequentam uma determinada via de ensino? Dos
estudantes de um ciclo de ensino? Ou, simplesmente, dos estudantes de
Guimarães?


2. Qual é o papel da Comissão de Festas? Quem é que a pode integrar?
Quais os conteúdos e quais os limites das suas atribuições? Será que
tem competência estatutária para excluir das festas outros estudantes
de Guimarães? Será que não seria tempo de se ponderar a criação de uma
estrutura orgânica permanente que funcione como estrutura de
enquadramento e de aconselhamento dos jovens que integram a Comissão,
capaz de transmitir o espírito das festas e da tradição, prevenindo a
possibilidade de intromissão e de manipulação por parte de “mentores”
adventícios?


(...)


5. Não seria este o tempo de repensar as Maçãzinhas? A ideia peregrina
de proibir os alunos das escolas básicas de participarem no cortejo,
além de alimentar fracturas desnecessárias, apenas serviu para fazer
sobressair o que já era visível: a decadência e o desajuste aos tempos
que correm daquele número das festas. Será que um cortejo apenas com
dois carros que cumpriam os mínimos (os outros eram uns veículos
motorizados de caixas aberta cobertos com papel de cenário) e sem
mascarados cumpre a tradição?


As considerações, bem como as perguntas, são pertinentes. Está na
altura de repensar as Festas. Não é preciso qualquer tipo de protocolo
para que a EB 2,3 Gil Vicente, bem como as outras EB 2,3, participem
de pleno direito no cortejo das Maçãzinhas. Em nenhum ponto dos
Estatutos da Academia se defende a participação exclusiva dos alunos
do Secundário (antigo complementar). Mais: à luz desta "inovação" em
cima do joelho, várias figuras de primeiro plano das Nicolinas nunca
teriam tido a sua oportunidade. Exemplo? O Saudoso Nicolino Mor, o
Engenheiro Hélder Rocha. No seu tempo de aluno, o Liceu funcionava
apenas até ao 5º ano (o actual 9º ano). Assim foi entre 1928 e 1958.
Hélder Rocha, Pregoeiro em 1935 e em 1936, "teria de esperar pela sua
vez".

A ignorância é traiçoeira. Não se culpe exclusivamente a rapaziada da
Comissão de Festas. Esta teve os seus méritos, e disso foram exemplo
os restantes números. São jovens, foram poucos (apenas seis, o que
levanta um novo -antigo- problema: o estatuto do Nicolino, guardado na
gaveta) e é natural que falhem aqui ou ali. Há responsabilidades que
devem ser assumidas.

Quanto a Urgezes, quer pelo seu papel na própria história das
Nicolinas, quer pelo passado mais recente, deve continuar a defender a
tradição e, se possível, reforçá-lo:

a) com a participação do Agrupamento (EB1-JI) no Pinheirinho (Cortejo
do Retábulo) já em 2015;


b) com a continuação do Projecto Nicolinas na EB 2,3 Gil Vicente:
palestras, elaboração do carro alegórico, embelezamento das fitas,
concurso de quadras para o cortejo do Pinheiro;


c) com a dinamização do número do "Dízimo de Urgezes", fazendo com que
o mesmo passe, se possível, para a noite, sendo na mesma a primeira
posse a ser, simbolicamente, entregue. A divulgação deste número
poderia trazer público ao evento. A criação de um "roteiro do Dízimo",
como oportunamente foi falado por elementos da presente Junta de
Freguesia, seria uma ideia a levar a cabo. Criação de um peddy paper
alusivo ao número que deu origem não só às Posses, mas também às
Maçãzinhas.

d) Aulas de toques nicolinos, em articulação com a EB 2,3. Exposições.

Um revés faz-nos cair. Mas podemos (e devemos) levantar a cabeça com
redobrada dignidade.

 PAULO GONÇALVES, AUTOR DO PREGÃO NICOLINO de 2014


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