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FESTIVAIS GIL VICENTE
Por Carla Manuela Mendes (Professora), em 2019/05/20553 leram | 0 comentários | 143 gostam
Como sói regularmente todos os anos, Gil Vicente sobe ao palco em Guimarães, com os festivais vicentinos, desta feita entre 30de maio e 16 de junho.

Mestre na arte dos autos
Nas comédias e nas farsas
Somos todos teus arautos
E na língua teus comparsas

Gil Vicente nosso patrono
Mestre ourives e de peças
No teatro ocupas o trono
Deste mundo às avessas!


Como sói regularmente todos os anos, Gil Vicente sobe ao palco em Guimarães, com os festivais vicentinos, desta feita entre 30de maio e 16 de junho.
No programa deste ano há espetáculos para todos os gostos, com companhias profissionais, e uma Mostra de Amadores de Teatro, marcando presença, entre outros, os alunos da Licenciatura em Teatro da Universidade do Minho e das oficinas do Teatro Oficina, conciliando-se deste modo formações, oficinas e encontros, de forma afazer-se a festa entre todos os amantes de teatro: profissionais, amadores e estudantes.
 Em simultâneo, ocorrerão ainda várias atividades paralelas, que culminarão com um debate sobre os Festivais Gil Vicente e um jantar convívio com rede (ver programa publicado em separado).
E louve-se Gil Vicente, que desta vez também não vai faltar em palco!
Com efeito, a peça “Maria Parda” de mestre Gil Vicente estará em cena no dia 1 de junho (17 horas), no pequeno auditório do CCVF, a cargo do grupo vimaranense “Os Musiké”, que desta forma salvará a honra do convento e mostrará a atualidade de um teatro com mais de 500 anos, que resiste à erosão do tempo.

De facto, no “Pranto de Maria Parda” é evidente essa intemporalidade do teatro vicentino, uma vez que a protagonista é vítima do consumo desmedido e da sede de ter e do querer, em detrimento do ser e da consciência daquilo que é indispensável.
 Mas, Maria Parda é também um retrato da sociedade lisboeta dos anos da fome de 1552, no reinado de D. Manuel I, que devido à escassez de produtos agrícolas, como a uva (e em especial o vinho), provocaria uma das muitas crises cíclicas em que este país rem sido fértil! Uma peça que funciona também em contraponto ao discurso oficial e laudatório da opulência, em que vivia a capital imperial portuguesa nessa altura:

“Eu só quero prantear
Este mal que a muitos toca
Qu’estou já como a minhoca
Que puseram a secar.
Triste desaventurada
Que tão alta está a canada
Para mim como as estrelas
Ó coitadas das goelas
Ó goelas da coitada”.
Deste modo, através desta pobre mulher alcoólatra, envelhecida e marginal, que se pranteia da falta de vinho e a que ninguém fia uma canada do precioso líquido (“em tempo de figos/não há aí nenhuns amigos?”), mestre Gil procura desvelar a vivência dos negros e mestiços (pardos), que chegavam a perfazer cerca de 10% da população lisboeta; e, simultaneamente, como é seu timbre, a criticar a sociedade quinhentista, no âmbito da máxima latina “Ridendo castigat mores”, ou seja, a rir se corrigem os costumes.

Ora, Guimarães tem mantido vivo Gil Vicente, ao longo dos tempos. De facto, na sua cidade-berço há uma Rua Gil Vicente, existe a Revista Gil Vicente publicada desde 1884 e o seu nome consta como patrono do Agrupamento de Escolas Gil Vicente, com sede em Urgezes, onde se crê terá nascido.
Quem o diz, é o escritor Camilo Castelo Branco no preâmbulo de “A Viúva do Enforcado”, narrativa com ação centrada em Guimarães, inserida na obra “Novelas do Minho”:
“a arte da ourivesaria foi cultivada primorosamente em Guimarães no século XV (…) Se eu pudesse desconfiar da infalibilidade dos linhagistas, justificá-los-ia num documento que possuo de 1445 (…)Com toda a certeza vivia na Caldeiroa, arrabalde da vila, o sapateiro Fernão Vicente , pai de Martinho Vicente. Este, que era ourives, morava então no Casal da Laje, em Santo Estevão de Urgezes. Aqui provavelmente nasceu Gil Vicente”.

Mas, mestre Gil Vicente, que nos deixou mais de 40 peças teatrais, tem também um monumento em sua homenagem (e ao teatro português), instalado na Alameda de S. Dâmaso inaugurado em 2002, e teve uma casa de espetáculos em seu nome: o Teatro Gil Vicente (1882); e, desde o ano de1957,em especial graças à ação de Joaquim dos Santos Simões, tem sido evocado nos Festivais Gil Vicente, geralmente celebrados a 8 de junho, que em tempos, por deliberação camarária, tomada em 1912, chegou a ser feriado municipal!
De facto, a 8 de junho de 1502, assinala-se a primeira representação da peça de Gil Vicente Monólogo do Vaqueiro ou Auto da Visitação, que o próprio Gil Vicente apresentou à rainha Dª. Maria, aquando do nascimento do seu primeiro filho: o futuro rei D. João III.

Recorde-se ainda que em 8 de Junho de 1902 a Câmara Municipal de Guimarães, aquando das comemorações do 4º. Centenário vicentino, divulgou pelas ruas da cidade um pregão evocativo, assinado pelo seu prestigiado presidente, Joaquim José de Meira, o que revela quanto Gil Vicente é querido na sua terra:
“A Câmara Municipal de Guimarães, faz saber a todos os habitantes deste concelho que no dia de hoje se completam quatro séculos que um dos vimaranenses mais ilustres, que os anais deste município registam, Gil vicente, iniciou nos Paços reais de el-rei D. Manuel o teatro português, conseguindo para Portugal glória imortal e para esta terra que se orgulha de o contar entre os seus beneméritos filhos honra invejável!
A Câmara Municipal, mantenedora e zeladora das preeminências deste concelho, cumprindo um dever indeclinável, solicita a todos os vimaranenses que entre outras demonstrações de público regozijo, se dignem, na noite de hoje, iluminar as suas casas, a fim de ficar consignado nos fastos de Guimarães que esta data memorável foi solenizada com o brilhantismo de que é merecedora”
Homenagem que o Agrupamento de Escolas Gil Vicente também lhe prestou, na letra do seu hino, bem como nas comemorações dos 25 anos, da sua fundação, em dezembro de 2015, dedicando-lhe este acróstico:
Guimarães é o teu berço
Insigne mestre de autos
Lusa Língua teus arautos!

Voz da sátira social
Ilustre ourives de respeito
Como patrono genial
Esta escola te rende preito!
Nas letras, ciências e arte
Tu és nosso porta-estandarte
Exemplo de vida e eleito.


Texto
de
Álvaro Nunes


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