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ESCAPADELA LITERÁRIA HOMENAGEIA JÚLIO DINIS
Por António Loureiro (Professor), em 2015/05/26490 leram | 0 comentários | 175 gostam
Ovar e sua terra, mar e ria, cidade onde o escritor Júlio Dinis viveu parte da sua vida, foi o cenário de mais uma Escapadela Literária que todos os anos homenageia, no Dia do Autor Português (22 de maio), as letras portuguesas
Situada entre o mar e suas praias, as dunas e a ria, a cidade recebeu-nos nas margens do rio Cáster e Parque Urbano de Ovar. Logo aí, nosso simpático guia nos deu conta da formação geomorfológica do concelho, parcialmente “roubado” ao mar e transportou-nos historicamente até aos tempos de antanho, em especial a 1514, data da concessão do foral manuelino à cidade. Num breve percurso pedestre, a deambulação no tempo e espaço, seguiu num saltinho ao centro histórico, até à atual Praça da República, local central das lojas volantes do antigo comércio vareiro e importante sala de espera do entreposto de transportes entre Porto e Aveiro e de transição norte-sul, em tempos passados: de e para norte por carruagem e via terrestre; e de e para sul, mais comodamente, por barco e via marítima e fluvial.
 Depois nas ruas circundantes, a beleza de alguns solares burgueses e acima de tudo a contemplação de Ovar, cidade-museu do azulejo. De facto, em consequência da emigração para Belém do Pará e Manaus, Ovar ostenta na maioria das fachadas das suas habitações, nas“ casas dos brasileiros”, paredes revestidas em azulejos, moda oriunda do Brasil trazida pelos emigrantes regressados, que aliam a sua beleza à sua utilidade, perante os rigores do clima litoral. De destacar, em muitos desse azulejos, utilizando a técnica de estampilha, as influências da Arte Nova e “Art Deco”, que no primeiro quartel do século XX sobressaem pelas cores fortes, plasticidade e volumetria dos ornamentos.
Por sua vez, o Largo da Família Soares Pinto, além da pausa para o café, propiciou ensejo para uma conversa sobre as atividades económicas e as tricas e nicas politiqueiras da cidade de outrora, em torno do Chafariz de Neptuno, ex-libris da cidade. Construído em 1877 como primeiro abastecimento público de água a nível urbano, despoletou de facto motivação para disputas virulentas e questiúnculas acesas entre regeneradores e progressistas e deu azo a mergulhar nos saberes da atividade piscatória dos tempos idos e na introdução da arte de xávega, no século XVII e na pesca de espécies pelágicas, nomeadamente da sardinha e da sua conservação pelo sal, que constituíram na época os motores económicos do concelho, que hoje se diversifica a todos os setores.

A Rua Júlio Dinis e o Jardim dos Campos, largo ajardinado defronte à Casa Museu Júlio Dinis, ornamentado com diferentes espécies de roseiras, conduziu-nos ao nosso objetivo central. Com efeito, nessa casa térrea de estrutura simples, similar a outras que seguem o modelo da arquitetura popular vareira, terra de seu pai e pertença de familiares, local onde o romancista portuense residiu desde 1863, na perspetiva da cura dos bons ares ovarenses para a sua doença da tuberculose, que o vitimaria precocemente, ali teriam sido escritos seus romances “As Pupilas do Senhor Reitor” e “A Morgadinha dos Canaviais” e teria aberto o coração para a vida simples do campo, que marcam a obra deste médico de nome Joaquim Guilherme Gomes Coelho, que no mundo das letras se assumiu com o pseudónimo literário de Júlio Dinis (1839-1871) – ler em separado o texto “Escapadela Literária relembra Júlio Dinis”.
Quanto à casa, classificada desde 1984 como Imóvel de Interesse Público, destacam-se a biblioteca, o espólio do escritor e vários objetos da etnografia local, distribuídos por três dependências: a sala com a mesa onde escrevia e o tinteiro de loiça negra, com paredes caiadas, soalho nu e teto liso de tábuas sobrepostas e pintadas, com os rodapés, cornijas e os frisos das portas fingindo mármores de cores vivas, na qual se destaca ainda um baú de pregaria, cadeiras e um armário de dois corpos; a cozinha com uma farta lareira servida por uma espécie de canapé para as gentes da casa e gato borralheiro e um forno para cozer o pão, que bem característica da aldeia, conserva a maceira, a paneira, a pá, o varredoiro, armários e cantareira, bem como nas suas paredes as candeias, pratos de faiança, travessas dos grandes assados e boiões das conservas; e o quarto, que como descreve Antero de Figueiredo no texto Júlio Dinis em Ovar, in Serões (1906) é “quasi quadrado , rescendendo ás maças a corarem nos frisos do tecto. A cama, de pau de setim com embutidos e cabeceira almofadada de antiga chita ás ramagens largas, estava encostada á parede. Defronte a commoda e o toucador; dentro de uma redoma, santos de marfim entre jarrinhas doiradas com jacinthos de panno; um cabide; e ao canto o sumido lavatório”.
Desta breve passagem vareira, Júlio Dinis em carta dirigida a Custódio Passos Dinis, escreve: “o prazer que experimentei nesta vida e que levo em Ovar, pode comparar-se a um banho tépido, agrada-me adormecendo-me”.

Após almoço no restaurante Snado, junto a uma braço da ria, a comitiva rumou seguidamente, bem comida e bebida, até à Reserva Natural das Dunas de S. Jacinto, ao longo de cujo e belo percurso o “stor” Manuel Oliveira explicou cinematograficamente este acidente geomorfológico, formando a laguna de água salgada com vários canais, entre os quais a ria de Ovar e a problemática das falhas tectónicas e afins …
E na Reserva, apesar da reserva, a surpresa da tarde! Devido a um ligeiro atraso dos visitantes, a guia ausentara-se, pelo que tivemos que recorrer ao presteza lusa, que permitiu calcorrear o percurso verde à laia de digestivo, guiados pelo sol e sinalizações no terreno e ater-nos a dar uma simples olhada de relance aos seus biótipos essenciais, fauna e flora desta área, que Raul Brandão na sua obra “Os Pescadores” (1923) referiu ser de “perfeição suprema”.

Uma passagem pela praia da Torreira e o pão-de-ló fofo e húmido ovarense deram-nos vigorosamente o que faltava de Ovar, já que o Carnaval aconteceu no autocarro, apesar do desvio (pirata) por uma cidade vizinha …

Texto da autoria de:
Professor aposentado
Álvaro Nunes


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