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Escapadela a Viana do Castelo
Por António Loureiro (Professor), em 2014/09/252176 leram | 0 comentários | 206 gostam
Havemos de ir a Viana, verso do refrão do fado/canção cantado por Amália Rodrigues, com letra de Pedro Homem de Mello, constituiu o mote para uma visita à cidade do Lima. E de facto fomos a Viana, no passado dia 13 de Setembro.
Viana Moderna, na marginal do rio, entre a marina sita junto à ponte Eiffel e os novos edifícios arquitetados por dois arquitetos portugueses premiados com o PritzKer ( Álvaro Siza Vieira em 1992 e Eduardo Souto Moura em 2011), galardão equivalente ao Nobel da Arquitetura, proporcionaram de facto as primeiras visitas. Deste modo, no Centro Cultural, que Souto Moura concebeu e comparou a uma mesa transparente para diversas atividades, tendo como referências icónicas dois ex-libris de Viana ( o navio-hospital Gil Eanes e a engenharia do ferro da ponte Eiffel), sentimos –nos deveras, nos seus três pisos, como no convés e no tombadilho de um navio navegando o Lima e imaginamos o próximo espetáculo anunciado de Cuca Roseta, dentro do próprio espetáculo que é este edifício, preparado para acolher cerca de 4 mil pessoas. Logo a seguir, nesta denominada Praça da Liberdade, onde também pontua um monumento sobre a Revolução dos Cravos, visitamos a Biblioteca Municipal. Aqui, a beleza de um edifício estruturalmente pesado, mas paradoxalmente leve, em que a simplicidade e a luminosidade se abrem com transparência à cidade e ao rio, em especial no amplo perímetro retangular do seu piso superior, em que apenas as estantes e os livros dividem os “compartimentos”, ora os mais coletivos ora os mais intimistas, literariamente arrumados em três áleas distintas e articuladas (denominadas Camões, Saramago e Pessoa), que são complementadas por vários outros espaços infanto-juvenis, como uma bebeteca e serviços de apoio, que prioritariamente ocupam o primeiro piso.
A Praça da República e seus monumentos quinhentistas como o seu chafariz, os antigos Paços do Concelho e o edifício da Misericórdia e Igreja, exemplar único da arquitetura de inspiração renascença e maneirista, com influências italianas e flamengas, foram outros pontos de referência da Viana de tempos idos. Tempos de outrora vivenciados também na visita ao Museu do Traje, situado nesta mesma praça, no qual a variedade e beleza dos trajes vianenses, quer de trabalho quer de domingar e de festa, se encontram patentes ao público, testemunhando etnograficamente a identidade e as tradições populares, também aqui complementados por uma exposição de objetos de ouro popular, no piso inferior (área do cofre do ex-edifício do Banco de Portugal), uma apresentação de utensílios usados na confeção de peças de ouro e ainda mostras temáticas sobre o ciclo do linho e seus instrumentos artesanais e, no piso superior, por uma exibição de joalharia moderna.
Um almoço substancial, onde não faltaram os tradicionais rojões minhotos, o saboroso arroz de sarrabulho e outras delícias, que alguns (os suspeitos do costume) antecederam com pataniscas, acompanhadas por tigelinhas de branquinho bem fresquinho de lamber a beiça, servido à laia de mata-bicho nas tasquinhas que o Grupo de Cantares e Danças de Perre tinham montado na emblemática praça, animada com folclore e venda de produtos regionais, dariam azo a renovadas energias para o itinerário vespertino, perante o calor do dia.
De tarde, com efeito, o percurso pedestre continuaria com novas sinergias pelo Hospital Velho (atual Posto de Turismo Regional), que outrora fora antiga pousada de acolhimento dos peregrinos de Santiago e que conserva as suas belas janelas de recorte manuelino e um pátio interior quinhentista; e prosseguiria com passagem pela Igreja Matriz (Sé de Viana) , que embora encerrada, evidencia no seu exterior uma estrutura maciça bem ao gosto da arquitetura românica e patenteia claras influências da estética gótica, em especial no portal em arco ogivado, afim dos portais galegos, recortado por três arquivoltas profusamente decorados, que são suportadas por seis esculturas dos apóstolos. O trajeto continuaria seguidamente até à Casa dos Abreu Távora ou Condes de Carreia (presentemente funcionando como edifício da Câmara Municipal), no qual se destacam as janelas e portas manuelinas, bem como a outras casas apalaçadas e senhoriais, entre as quais a Casa dos Melo Alvim (atual unidade hoteleira), considerado o solar mais antigo da cidade e que também ostenta janelas e ameias em estilo manuelino. De permeio e antes das compras (pelas suspeitas do costume) e após breve descanso na esplanada do Viana Shopping, com vistas sobranceiras sobre o rio, o mar e a cidade, uma visita ao Museu de Artes Decorativas que inclui uma bela coleção de faianças da famosa Fábrica de Louça de Viana (1774-1855) e mobiliário indo-português, em especial contadores antigos.
Santa Luzia, subida no funicular ou elevador homónimo, que data de 1923, conduziu-nos ao longo dos seus 650 metros de extensão e 160 metros de desnível , à Basílica ou templo-monumento do Sagrado Coração de Jesus, que assoma Viana, o mar e a foz do Lima. Projetado por Ventura Terra (1866-1919), em granito da região e estilo revivalista, congregando elementos neorromânicos, neobizantinos e neogóticos e construído no espaço onde cerca de três séculos antes existia uma capela dedicada à padroeira da vista e dos olhos, o local é de facto um deslumbrante mirante que faz jus à santa e às belas vistas, cuja paisagem predominantemente entre verde e o azul se pode contemplar do seu miradoiro fronteiro e/ou zimbório, que alguns mais descansados corajosamente subiram escada acima e desceram escada abaixo ( o tal caso de subir para cima) …
Em súmula e como diz Saramago na sua Viagem a Portugal: “Viana do Castelo é pródiga em portas e janelas manuelinas, algumas simples, outras de lavor apurado, tanto que com justiça se pode dizer que Viana põe à vista do viajante o que tem de melhor”. Não fosse Santa Luzia patrona da(s) boa(s) vista(s) …
E foi deste modo que cumprimos o nosso fado: “se o meu amor não me engana/como engana a fantasia/ havemos de ir a Viana/ó meu amor de algum dia”. E fomos …

Professor aposentado
Álvaro Nunes


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