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EDUCAÇÃO: MUNICIPALIZAÇÃO OU DESCENTRALIZAÇÃO?
Por António Loureiro (Professor), em 2015/05/04531 leram | 0 comentários | 159 gostam
Afirmando que “as escolas não precisam de novas tutelas” a FENPROF manifesta-se contra a municipalização da educação, uma vez que, na sua perspetiva, estas apenas necessitam de condições para o exercício de uma verdadeira autonomia
Com efeito, no Encontro sobre a Municipalização da Educação, realizado no Porto em finais de fevereiro, a FENPROF opõe-se à municipalização da educação, embora seja favorável à descentralização e reconheça aos municípios um papel essencial na definição de políticas educativas locais. Contudo, entende que num país com tantas assimetrias e com grande diversidade de práticas municipais, bem como pela “prática de incumprimento por parte do poder central nas suas responsabilidades para com o poder local”, este processo apresenta perigosas potencialidades, entre as quais destaca o aprofundamento de assimetrias e a existência de quebras de qualidade educativa. Outros alertas apontam ainda para “a segregação de alunos, designadamente dos que apresentam Necessidades Educativas Especiais (NEE)”, bem como o desenvolvimento de processos de privatização e “ainda mais fortes constrangimentos ao exercício da autonomia pelas escolas” .
Concretamente, insurge-se ainda contra o papel de menoridade e subalternidade atribuído às escolas e aos professores, não só por estarem colocados à margem de uma discussão e negociação em que deviam estar implicados, como também por caber aos municípios “acordar com os agrupamentos de escolas e as escolas o exercício conjunto ou a subdelegação de competências” . De igual modo, realça-se que “o governo procurou esconder o gato, mas deixou-lhe o rabo de fora” , alertando para situações várias como os chamados incentivos à eficiência e as competências em matéria de formação e formação contínua de professores, entre outras. Mas também para a gestão de professores, equipamentos, matrículas, a aprovação das turmas e para o estabelecimento de parcerias com privados, ou seja, “verdadeiras PPP sobre resposta a alunos com NEE, ofertas vocacionais e profissionalizantes, desenvolvimento das componentes curriculares locais e serviços de psicologia e orientação”.
Outra das vozes críticas do encontro veio do professor catedrático da Universidade do Minho Licínio Lima. De acordo com este investigador as recentes orientações políticas do MEC visam a transformação das escolas em extensões do Ministério com “um acréscimo de controlo a partir dos seus serviços centrais”, designadamente através de plataformas eletrónicas e nova cibervigilância sobre as escolas, num cenário marcado pelo “uso e abuso de promessas no sentido do reforço da autonomia das escolas” , desde 1987, mas que, na prática, não passarão do que chama de uma “autonomia enclausurada” . Situação que, em sua opinião, graças às potencialidades da escola pública, pode ser aproveitada , pois “se queremos democratizar e descentralizar o sistema educativo temos que saber quem são os nossos parceiros, os nossos aliados e os municípios podem sê-lo” .
Já quanto aos pontos de vista dos autarcas, estes são diferenciados. Carlos Pinto Sá, da Câmara de Évora, por exemplo, afirma que “o Estado despeja responsabilidades para cima das autarquias mas não entrega as verbas necessárias “, pois a própria “ lei das finanças locais nunca foi cumprida”, pelo que, conclui, com a municipalização “poderá assistir-se a uma agravamento da situação, com mais assimetrias entre interior e litoral, entre urbano e rural”.
Por seu turno, contudo, Isidro Figueiredo, da Câmara de Oliveira de Azeméis, entende que se pode “fazer mais e melhor com menos (verbas )” defendendo que “a gestão de proximidade assim o permite”. Reconhece todavia que “há ainda um caminho a percorrer”, adiantando querer “salvaguardar para a escola a componente pedagógica” e simultaneamente, que “é preciso trabalhar mais em rede”.
Susana Amador, da Câmara de Odivelas, por sua vez destacou os cortes sucessivos na educação e na redução de verbas do Estado para as autarquias, com consequentes perdas de autonomia financeira e orgânica , defendendo que não existem estudos fundamentados para se avançar para esta municipalização, que surge em final de legislatura e em ano eleitoral, num modelo que, a seu ver, “não é de efetiva descentralização”.
 
Obviamente, não é esta (de todo) a opinião da tutela. Fernando Reis, secretário de Estado do Ensino Básico e Secundário, em entrevista concedida ao Jornal de Letras/educação de 17 de março último, enfatiza que o objetivo do Programa Aproximar Educação é “melhorar o sistema público de educação” através da “descentralização de competências”. No seu entender, autonomia e descentralização seriam os fatores fundamentais deste processo, promovendo-se assim “a proximidade da decisão e a consolidação do papel e envolvimento dos municípios como parceiros estratégicos na melhoria da qualidade da educação” . No mesmo diapasão, explicitaria ainda que “o modelo de atribuição de competências é o que resultar do diálogo estabelecido entre escolas e municípios”, abrindo a possibilidade de construção de consensos, acrescentando no entanto que “há funções em que é fundamental que se mantenha a dimensão nacional e central com uma ampla base comum, como acontece com o curriculum nacional, o financiamento ou a organização e regulação da avaliação externa” .
Neste sentido e negando perentoriamente que “não estamos a desenvolver um projeto de municipalização” , explicaria ainda que “o projeto-piloto não envolve qualquer alteração de vínculos e direitos dos docentes com o MEC”, bem como “não prevê transferência ou delegação de competências de gestão do pessoal docente, mantendo estes o seu vínculo ao MEC”, especificando também, em aditamento, que “é salvaguardada e assegurada a autonomia dos AE/E e as competências próprias dos respetivos órgãos” . Outrossim, defende que esta nova forma de governação da educação rompe com o centralismo instalado e que “fica reforçado o compromisso com a melhoria dos resultados escolares, a prevenção do abandono escolar e a redução das taxas de retenção”.
Em suma, um processo apressado, de um secretismo pouco aceitável num regime democrático, como dizem algumas vozes, ou uma controversa via de mudança, pois parece optar pelo reforço dos municípios versus autonomia dos agrupamentos, confundindo descentralização com delegação de competências, como dirão outros. O que é certo é que ainda ninguém se preocupou em perguntar às escolas o que e que realmente querem, importando clarificar “quem faz o quê, com que meios e com que resultados” …

Artigo Escrito por Álvaro Nunes
(Professor aposentado)


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