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CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO CHUMBA RETENÇÕES
Por António Loureiro (Professor), em 2015/05/06448 leram | 0 comentários | 136 gostam
No passado mês de fevereiro, o Conselho Nacional de Educação (CNE) divulgou um estudo denominado “Recomendação sobre a Retenção Escolar no Ensino Básico e Secundário”, no qual se recomendam alternativas diversas à cultura de retenção.
De facto, fundamentado num Relatório Técnico de cerca de 89 páginas, precedido por uma revisão da literatura e enquadramento legislativo alusivo, o CNE produz uma reflexão profunda sobre esta matéria, que abarca ainda, entre outras temáticas, as práticas de sucesso no combate ao insucesso e a evolução da retenção no ensino, sustentada em dados estatísticos. Este documento é ainda acompanhado por uma Recomendação que ao longo das suas 18 páginas detalha alguns destas vertentes, elencando e concretizando um conjunto de medidas recomendáveis.
Efetivamente e partindo dos resultados da investigação que demonstram que os alunos retidos, nomeadamente nos anos iniciais de escolaridade, não melhoram os seus resultados e são mais propensos a uma nova retenção, o estudo reconhece ainda que a retenção “potencia comportamentos indisciplinados, fruto de uma baixa autoestima e desenquadramento em relação à turma de acolhimento, o que dificulta, ainda mais, a aprendizagem”, situação que acrescentam , “favorece a emergência de alunos com lideranças divergentes da cultura escolar, que contaminam os pares e o ethos das turmas”.
É neste pressuposto que se reconhece a retenção como “uma medida ineficaz “, pelo que numa perspetiva de política educativa “é sustentável que se defenda uma intervenção no sentido de substituir, pelo menos parcialmente, a prática de retenção por medidas de combate ao insucesso”, as quais se entende poderão ser mais eficazes e até menos dispendiosas do ponto de vista da utilização de recursos.
Com efeito, em Portugal existem anualmente mais de 150 mil alunos que ficam retidos no mesmo ano de escolaridade e de acordo com os dados do PISA 2012, cerca de 35% dos jovens portugueses com mais de 15 anos tinham já sido retidos pelo menos uma vez, contra à média OCDE de 13%, enquanto mais de 7,5% apresentam no seu percurso mais de uma retenção. Aliás as retenções têm subido no básico desde 2011, registando-se no ano transato um ligeiro aumento de 0,7%. Dados tanto mais preocupantes quando se sabe que Portugal apresenta um enquadramento legal semelhante aos dos outros países europeus e a retenção é, na legislação em vigor, assumida “a título excecional”, embora na prática esta excecionalidade não aconteça. De facto, verifica-se em contrapartida que prevalece uma cultura de retenção, ou seja, subsiste “ a crença comum de que a repetição de um ano é benéfica para aprendizagem dos alunos”, sendo recorrente a ideia de retenção como sinónimo de exigência e de qualidade das aprendizagens em oposição a uma sistema “facilitista”. No entanto, lê-se no citado documento, “a transição responsável dos alunos com baixo rendimento escolar acarreta uma maior exigência, uma vez que pressupõe, por parte de todos os intervenientes, um esforço acrescido no desenvolvimento de estratégias e medidas de apoio e reforço das aprendizagens”.
Ora, essas alternativas são coerentemente apresentadas na aludida “Recomendação”. Assim, desde a intervenção precoce aos primeiros sinais de dificuldades de aprendizagem, nomeadamente no último ano do pré-escolar e nos dois primeiros anos de escolaridade, até à melhoria dos processos de avaliação e combate à cultura da “nota” , passando ainda pela mobilização de professores e a organização da escola para o sucesso, o documento citado apela ainda ao compromisso e coresponsabilização dos alunos e das famílias no sentido do cumprimento dos programas concebidos e medidas acordadas, no âmbito da recuperação das aprendizagens e controlo da indisciplina, bem como no contexto do envolvimento da representação parental nos diferentes órgãos e estruturas escolares.
Quanto às recomendações enumeram-se concretamente e apenas algumas dessas principais medidas. Assim, por dificuldades de espaço omitiremos as situações circunscritas ao âmbito da administração educativa central, que podem e devem ser lidas no documento original. Atemo-nos assim e tão-somente às medidas no âmbito das escolas , que são a saber:
* a promoção de lideranças pedagógicas, orientadas para as aprendizagens e sucesso educativo, com responsabilidades acometidas aos diretores, conselho pedagógico, coordenadores de ciclo e departamento e diretores de turma;
* a implementação de um plano de formação dirigido para as didáticas específicas, metodologias de trabalho, modalidades de avaliação das aprendizagens e controlo da indisciplina;
* a promoção de uma pré-escolarização de qualidade;
* o desenvolvimento de processos e instrumentos de diagnóstico e sinalização precoce de dificuldades;
* o desencadeamento de estratégias de apoio aos primeiros sinais de dificuldades, com incidência nos primeiros anos de escolaridade de cada ciclo;
* a conceção de programas intensivos e exigentes de apoio às dificuldades, alocando recursos e profissionais com competências nestas áreas;
* a melhoria dos processos de avaliação interna das aprendizagens, contrariando a tendência de contaminação destes pelos processos de avaliação externa;
* a centragem da informação a alunos e famílias nas aprendizagens realizadas e em défice e nas estratégias delineadas para a sus superação;
* a publicitação dos resultados globais dos processos de avaliação dos alunos
 * a adoção de práticas de envolvimento e corresponsabilização parental no processo educativo;
* a valorização do papel dos representantes parentais nos órgãos de gestão/estruturas das escolas e associações parentais.

Em súmula, um assunto pertinente que merece uma reflexão séria por parte das escolas e que foi também tema de discussão em vários órgãos de comunicação social. Leia-se, a este propósito, o semanário Expresso e a sua reportagem no Agrupamento de Escolas de Carcavelos, intitulada “A Escola onde ninguém chumba”, bem como o depoimento do ministro da tutela, Nuno Crato, que nesta mesma página defende que é objetivo do Ministério da Educação “reduzir progressivamente as taxas de retenção, mas não meramente por questões económicas e nunca de forma artificial”. Para o efeito, o Ministério acredita que “o efeito conjugado dos novos programas e metas curriculares , generalização da avaliação externa , devolução da autonomia pedagógica aos docentes e uma intervenção precoce e atempada” irá melhorar os resultados, ignorando deste modo várias das medidas propostas pelo CEN. no âmbito da administração educativa central.


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